quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Chuva, Suor e Cerveja

Caetano Veloso



Não se esqueça de mim
Não se esqueça de mim
Não desapareça 


Que a chuva tá caindo
E quando a chuva começa
Eu acabo perdendo a cabeça



Não saia do meu lado
Segure o meu pierrot molhado
E vamos embolar ladeira abaixo
 
Acho que a chuva ajuda a gente a se ver
Venha, veja, deixa, beija, seja
O que Deus quiser

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Simpatia

(Afonso Schmidt)
Numa tarde longa e mansa,
os dois pela estrada vão:
o cão estima a criança,
e a criança estima o cão.
Que delicada aliança
dos seres da criação:
uma risonha criança,
um robustíssimo cão.
Deus percebeu a lembrança
e sorriu lá na amplidão:
ele gosta da criança,
que trata bem o seu cão.
Por isso, na tarde mansa,
os dois felizes lá vão:
a delicada criança
e o robustíssimo cão.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Via Espessa IV

(Hilda Hist)

O louco estendeu-se sobre a ponte
E atravessou o instante.

Estendi-me ao lado da loucura

Porque quiz ouvir o vermelho do bronze

E passar a lingua sobre a tintura espessa
De um açoite.

Um louco permitiu que eu juntasse a sua luz

À minha dura noite.

terça-feira, 13 de julho de 2010

A Inocência do Prazer

(Cazuza / George Israel)
Já passou, fomos perdoados
Por todos os deuses do amor
Acabou podemos ser claros
Como era antes, seja lá como for
Alguém tentou desesperadamente
Sentir algo decente
Sou feliz, pois já fui julgada 
Daqui pra frente, tudo é meu
Então fala baixo e sente 
Eu vou te dar um presente

Vento novo, flores e cores
Fim do verão tropical
Novos ares, novos amores
Tudo de volta, ao seu estado normal
Sou feliz e trago as provas
Nos meus olhos molhados
E vejo a vida tão diferente
Eu já não posso entender
Então fala baixo e sente
Eu vou te dar um presente

A solidão vai ficar grudada
Nas coisas que você negar
Nesta tarde desanimada
Embalada em frontal
Telefone, hora marcada
Tudo é tão social
Quero alguém pra falar a verdade
E não pra me baixar o astral
Então fala baixo e sente
Eu vou te dar um presente

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Baby Can I Hold You


(Tracy Chapman)

Sorry, is all that you can't say
Years gone by and still
Words don't come easily
Like sorry, sorry, sorry

Forgive me, is all that you can't say
Years go by and still
Words don't come easily
Like forgive me, forgive me, forgive me.
But you can say baby
Baby can i hold you tonight
Baby if i told you the right words
Oh, at the right time
You'd be mine.

I love you, is all that you can't say
Years gone by and still
Words don't come easily
Like i love you, i love you.

domingo, 4 de julho de 2010

Lua Nova

(Edward)
O que fazer quando se perde o Sol?
O que fazer quando não há mais razão para existir?
Quando o propósito vai embora?
A alma se esvai
O calor nos deixa
O tempo não passa
E quando se encontra uma Lua?
Um reflexo de vida
Uma chama de esperança
Ganhar novas razões para existir
Mas existir sem esquecer a dor
Existir trazendo-a consigo a todo instante
Viver o novo sem esquecer o velho
Sentir o velho enquanto o novo cresce
Tentando sobreviver a duas realidades distintas
E quando o velho volta a ser presente?
Coexistir com o novo é impossível
Voltar a amar o que nunca morreu

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Versos Íntimos

(Augusto dos Anjos)

Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!

terça-feira, 29 de junho de 2010

O Hóspede

de Castro Alves

Choro por ver que os dias passam breves
E te esqueces de mim quando tu fores
Como as brisas que passam doudas, leves,
E não tornam atrás a ver as flores.
TEÓFILO BRAGA

Prólogo
Onde vais estrangeiro! Por que deixas
O solitário albergue do deserto?
O que buscas além dos horizontes?
Por que transpor o píncaro dos montes,
Quando podes achar o amor tão perto?...

"Pálido moço! Um dia tu chegaste
De outros climas, de terras bem distantes...
Era noite!... A tormenta além rugia...
Nos abetos da serra a ventania
Tinha gemidos longos, delirantes.

"Uma buzina restrugiu no vale
Junto aos barrancos onde geme o rio...
De teu cavalo o galopar soava,
E teu cão ululando replicava
Aos surdos roncos do trovão bravio.

"Entraste! A loura chama do brasido
Lambia um velho cedro crepitante,
Eras tão triste ao lume da fogueira...
Que eu derramei a lágrima primeira
Quando enxuguei teu manto gotejante!

"Onde vais, estrangeiro? Por que deixas
Esta infeliz, misérrima cabana?
Inda as aves te afagam do arvoredo...
Se quiseres... as flores do silvedo
Verás inda nas tranças da serrana.

"Queres voltar a este país maldito
onde a alegria e o riso te deixaram?
Eu não sei tua história... mas que importa?...
...Bóia em teus olhos a esperança morta
Que as mulheres de lá te apunhalaram.

"Não partas, não! Aqui todos te querem!
Minhas aves amigas te conhecem.
Quando à tardinha volves da colina
Sem receio da longa carabina
De lajedo em lajedo as corças descem!

"Teu cavalo nitrindo na savana
Lambe as úmidas gramas em meus dedos,
Quando a fanfarra tocas na montanha,
A matilha dos ecos te acompanha
Ladrando pela ponta dos penedos.

"Onde vais, belo moço? Se partires
Quem será teu amigo, irmão e pajem?
E quando a negra insônia te devora,
Quem, na guitarra que suspira e chora,
Há de cantar-te seu amor selvagem?

"A choça do desterro é nua e fria
O caminho do exílio é só de abrolhos
Que família melhor que meus desvelos?...
Que tenda mais sutil que meus cabelos
Estrelados no pranto de teus olhos?...

"Estranho moço! Eu vejo em tua fronte
Esta amargura atroz que não tem cura.
Acaso fulge ao sol de outros países,
Por entre as balças de cheirosos lises,
A esposa que tua alma assim procura?

"Talvez tenhas além servos e amantes,
Um palácio em lugar de uma choupana,
E aqui só tens uma guitarra e um beijo,
E o fogo ardente de ideal desejo
Nos seios virgens da infeliz serrana!..."

No entanto Ele partiu!... Seu volto ao longe
Escondeu-se onde a vista não alcança...
. . . Mas não penseis que o triste forasteiro
Foi procurar nos lares do estrangeiro
O fantasma sequer de uma esperança!...
Curralinho, 29 de abril de 1870.